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Lideranças do Movimento Negro são homenageadas em Sorocaba

Evento, realizado por meio de parceria entre o Movimento Negro Unificado e o Instituto de Gestão Social e Cidadania (IGESC), serviu como exemplo da importância de ações afirmativas realizadas por lideranças políticas, comunitárias, religiosas, culturais e educacionais

Homenagem ao Movimento Negro

Homenagem ao Movimento Negro

"Nós geralmente damos reconhecimento para as pessoas depois que elas morrem. Muitas vezes bem depois de sua morte. Receber isso em vida é uma emoção muito grande". Com essa fala, Ademir de Barros, um dos homenageados da noite, abriu seu discurso. Ademir é integrante do Nucab (Núcleo de Cultura Afro-Brasileira de Sorocaba) e doutor em educação.

O intuito da celebração, segundo a organização, foi reconhecer a "trajetória de luta de cada um" e as contribuições que essas lideranças negras deram, ao longo de suas jornadas, para a "construção de uma sociedade menos desigual e mais justa". Por isso, os homenageados foram pessoas que atuam de acordo com os princípios de Formação, Convivência, Ação e Transformação, os mesmos que orientam as instituições organizadoras.

De acordo com a psicopedagoga e militante negra desde 1980 Lourdes Lieje, a ideia do evento surgiu da necessidade de uma reparação. "Nós precisamos ter reconhecimento em vida. É importante nos lembrarmos daquelas pessoas que já se foram, mas das que estão hoje e que fazem a história da cidade também. A fala da Vanda nos faz perceber que somos realmente apagados pela história e esse apagamento não pode mais acontecer."

Saúde, uma área ainda desvalorizada

Vanda Lopes de Oliveira Pereira iniciou sua carreira em 1967 como auxiliar de enfermagem, ela enfrentou o desafio diário de viajar de Sorocaba/SP a Mogi das Cruzes/SP para concluir sua graduação em Enfermagem. Chegou ao cargo de diretora do hospital Santa Lucinda, um dos mais conhecidos de Sorocaba/SP, função que ocupou por 40 anos. Após a aposentadoria, sua paixão pelo ensino a levou a compartilhar seus conhecimentos com as novas gerações, atuando como professora no Projeto FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) em Sorocaba/SP. Vanda foi responsável por uma das falas mais impactantes da noite: "eu sou uma mulher negra e pertenço a uma área esquecida, a enfermagem. Jamais imaginei em minha vida que receberia um reconhecimento como este."

A importância da saúde mental

Reconhecida pelos seus trabalhos de pesquisa e defesa da saúde mental de pessoas pretas e trans, Ruca Maria é uma mulher preta e trans, administradora por formação e dançaria por vocação. Ao receber a premiação ela afirmou que a saúde mental é necessária para todas as pessoas. "Quando a gente fala de problemas estruturais, do racismo na cidade, é preciso falar também de um grande câncer que é a exclusão da saúde mental da população preta", aponta Ruca Maria. Para ela, a população preta não tem mais que "fazer 300% para ser reconhecido como igual. Ela tem que fazer o que realmente faz sentido para si" e isso só será possível se as pessoas se autoconhecerem.

Políticas públicas para o acesso à leitura

Homenageada pelo seu trabalho na área da literatura, Ariani Teodoro é fã de livros e clubes de leitura, curadora do Cine por elas (um projeto que combina literatura e cinema) e idealizadora da página @ari_entrelinhas no Instagram, onde escreve majoritariamente sobre literatura negra e feminina. Para ela, ganhar um prêmio em vida é extremamente importante porque as maiores lideranças negras foram reconhecidas muito depois da sua morte. "Vide Carolina Maria de Jesus que hoje é um grande ícone, que todo mundo fala, que foi traduzida para mais de 13 idiomas e não teve o reconhecimento que ela merecia em vida." De acordo com Ariani, o segredo para que mais pessoas tenham acesso à literatura, está no investimento em políticas públicas. "O livro no Brasil é caro e são poucas as pessoas que acessam bibliotecas também, a gente tem as bibliotecas comunitárias que muitas vezes são fruto das próprias pessoas que estão na comunidade. Mas as políticas públicas precisam ser incentivadas para que a literatura chegue para todos."

O Movimento Negro Unificado

O é uma organização que surgiu no fim dos anos 1970 com o objetivo de lutar contra o racismo na sociedade brasileira. Ele foi criado em um contexto de efervescência racial, marcado por uma série de episódios discriminatórios em São Paulo. Suas lutas renderam resultados como por exemplo:

  1. Proclamação do Dia Nacional da Consciência Negra em 20 de novembro.
  1. Proibição da discriminação racial na Constituição Federal de 1988.
  1. Criação da Lei Caó, de 1989, que tipifica o crime de racismo no código penal.

Conforme documento fornecido pela organização, o MNU se formou em meio a um ambiente de repressão durante a ditadura civil-militar, especialmente após a promulgação do AI-5. Neste período, manifestações eram fortemente reprimidas, e o movimento negro tornou-se uma força fundamental na contestação ao governo de Ernesto Geisel. Os jovens militantes, inspirados por eventos como a proibição de quatro jovens negros de usar a piscina do Clube de Regatas Tietê e a morte do trabalhador Nilton Lourenço, uniram-se a outros grupos organizados em partidos de esquerda para formar o MNU.